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IRPJ e CSSL: depreciação acelerada incentivada da lavoura canavieira.



13/02/2017




Para nossa honra e alegria, damos início, a partir deste artigo, à coluna “Direito do Agronegócio”, que pretende explorar diversos temas relevantes e polêmicos que envolvem o setor. O destaque do agronegócio pode ser identificado, inclusive, do ponto de vista jurídico, a partir do texto constitucional, no artigo 187, inciso I, ao regular a política agrícola, dispondo que esta “será planejada e executada na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes, levando em conta, especialmente”, instrumentos “fiscais”. Daí ser possível reconhecer que a Constituição Federal já estabelece como conduta indutora da atividade estatal, sobretudo legislativa, a utilização de instrumentos fiscais com o objetivo de fomentar esse setor da economia, até mesmo pelo fato de possuir total vinculação com a própria sobrevivência e dignidade do ser humano, fundamento do Estado Democrático de Direito (artigo 1°, III, CF/88). Tais ponderações iniciais se tornam pertinentes para o nosso estudo, uma vez que pretendemos explorar a tributação no agronegócio, notadamente, nesta oportunidade, a chamada “depreciação acelerada incentivada” para fins de Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro (CSLL), no regime do lucro real. Com o objetivo de fomentar a atividade do agronegócio, houve a edição da Medida Provisória 2.159-70/2001, a qual dispõe no artigo 6° que: “Os bens do ativo permanente imobilizado, exceto a terra nua, adquiridos por pessoa jurídica que explore a atividade rural, para uso nessa atividade, poderão ser depreciados integralmente no próprio ano da aquisição”[1]. Trata-se de um incentivo fiscal, na linha do disposto no próprio artigo 187, I, da Constituição Federal, que tem por finalidade fomentar a atividade rural mediante a concessão de um incentivo voltado para a forma de dedução do IRPJ e CSLL, mais precisamente denominada de depreciação, diante dos altos custos empregados na fase agrícola dessa operação, além de peculiaridades de cunho climático, natural e econômico, entre outros. Quando se trata do tema da depreciação acelerada incentivada no agronegócio, nos termos do artigo 6° da Medida Provisória 2.159-70/2001, uma das discussões mais polêmicas envolve a lavoura da cana e seus respectivos gastos. Isso porque, como veremos, há divergência no sentido de que tais gastos com a lavoura canavieira não estariam sujeitos à depreciação, mas, em verdade, à exaustão, o que impediria o gozo daquele incentivo, sobretudo pelo fato de que se aplicaria o artigo 111 do Código Tributário Nacional, exigindo uma interpretação restritiva[2]. Em síntese: é possível aplicar a depreciação acelerada incentivada à lavoura canavieira? A Receita Federal do Brasil veda o gozo de referido incentivo aos contribuintes, inclusive com a lavratura de lançamentos de ofício, eis que sustenta ser exaustão. Daí a razão de nosso artigo, pois o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), por sua Câmara Superior, deve julgar, em breve, pela primeira vez esse tema, principalmente após sua reabertura, permitindo, assim, um norte inicial a respeito da discussão[3]. Mas, antes de passarmos o nosso posicionamento a respeito da questão, alguns esclarecimentos devem ser estabelecidos. A depreciação acelerada incentivada consiste na autorização legal às pessoas jurídicas optantes pelo lucro real de deduzir para fins de apuração do IRPJ e CSLL os gastos (despesas) que devem ser reconhecidos como ativo imobilizado. Em geral, como veremos, essa dedução se dá ao longo do tempo de vida útil do bem, que supera, naturalmente, o ano calendário. Daí a diferença daquela depreciação qualificada como acelerada, pois ela antecipa essas deduções, já que permite a aplicação integral no próprio ano. Para o setor do agronegócio, temos a base legal no artigo 6° da Medida Provisória 2.159-71/2001, sendo um incentivo fiscal voltado ao fomento dos investimentos e produção no setor, com os seguintes requisitos, como já vis (i) seja aquisição de bens para o ativo permanente (atualmente, imobilizado), salvo terra nua; (ii) por pessoa jurídica que explore atividade rural; (iii) uso nessa atividade. Portanto, preenchido tais requisitos estabelecidos na medida provisória, é possível a depreciação integral dos bens no próprio ano da aquisição. Diante de tais requisitos, voltamos ao problema a ser enfrentado: (i) o artigo 6° da Medida Provisória 2.159-71/2001 há de ser interpretado restritivamente, por força do artigo 111 do Código Tributário Nacional?; (ii) a lavoura canavieira estaria sujeita à depreciação ou à exaustão? A primeira observação diz respeito ao equívoco na pretensão de se aplicar o artigo 111 do Código Tributário Nacional à depreciação acelerada incentivada. Esse incentivo fiscal não configura nenhuma das hipóteses estabelecidas em referido dispositivo, pois inexiste suspensão (artigo 151 CTN) ou exclusão do crédito (artigo 175, CTN), outorga de isenção ou mesmo dispensa de obrigações acessórias. Portanto, como referido dispositivo normativo é uma exceção, se não há previsão legal expressa, este não pode ser aplicado. Mais do que isso, interpretação literal não conduz necessariamente à restrição do texto normativo para a construção da norma jurídica a ser aplicada, como pretende a Receita Federal ao analisar o incentivo fiscal previsto no artigo 6° da MP 2.159-70/2001. Até porque é preciso analisar esse incentivo a partir do texto constitucional, que estabelece a necessidade de fomento da atividade mediante instrumentos fiscais, de tal sorte que não há qualquer impedimento ao intérprete de dar à depreciação acelerada incentivada uma interpretação finalística[4]. Portanto, há de se interpretar o artigo 6° da Medida Provisória 2.159-70/2001 sempre com o objetivo de não restringir sua aplicação a fim de que se tornar, efetivamente, um instrumento de incentivo de investimentos e produção no setor do agronegócio. De outro lado, com relação à discussão da depreciação ou exaustão da cana, é importante esclarecer que, naturalmente, diversos gastos na formação da lavoura serão incorporados ao valor da cultura, configurando um ativo que poderá perder seu valor por algumas razões. Esta perda do valor do ativo pode ser reconhecida de três formas: (i) depreciação; (ii) amortização; (iii) exaustão. Podemos identificar tais institutos no artigo 183, parágrafo 2° da Lei 6.404/76 (LSA), o qual preceitua: “§ 2° A diminuição do valor dos elementos dos ativos imobilizado e intangível será registrada periodicamente nas contas de: a) depreciação, quando corresponder à perda do valor dos direitos que têm por objeto bens físicos sujeitos a desgaste ou perda de utilidade por uso, ação da natureza ou obsolescência; b) amortização, quando corresponder à perda do valor do capital aplicado na aquisição de direitos da propriedade industrial ou comercial e quaisquer outros com existência ou exercício de duração limitada, ou cujo objeto sejam bens de utilização por prazo legal ou contratualmente limitado; c) exaustão, quando corresponder à perda do valor, decorrente da sua exploração, de direitos cujo objeto sejam recursos minerais ou florestais, ou bens aplicados nessa exploração”. A depreciação, deste modo, consiste na perda do valor em virtude do desgaste ou perda da utilidade pelo uso, da ação da natureza ou obsolescência, enquanto a exaustão está relacionada à perda como decorrência da própria exploração de direitos, sejam minerais ou florestais, além dos bens aplicados nessa exploração. Ora, no caso da lavoura canavieira, é possível afirmar que se trata de uma depreciação. Quando se trata do cultivo da cana-de-açúcar, o procedimento se dá com a preparação do solo, com a eliminação das soqueiras e resíduos (“destoca”), aragem, correção do solo e confecção das valas (sulcos) onde serão inseridas mudas (toletes de cana) com a respectiva cobertura (tapamento dos sulcos). As mudas colocadas nas valas, em verdade, são um pedaço de caule (colmo também chamado de olhadura), que irão germinar. Com a germinação, temos as touceiras, com nascimento de raízes, que levarão ao nascimento dos colmos, que serão objeto de corte e é onde está o caldo contido na planta relevante para o processo produtivo (de onde se obtém a sacarose) e que, a cada colheita, perde em qualidade (produtividade). Ainda dentro da atividade rural, a touceira (denominada de soqueira após o primeiro corte) é a parte viva da planta e que, fixada por raízes, sustenta todo o ciclo de produção com o brotamento de novos colmos que serão cortados. Em geral, o valor econômico se reduz com os sucessivos cortes diante da diminuição da produção de sacarose, até que se tenha a inviabilidade da cultura (normalmente, cinco cortes). Ao se reproduzir de forma breve o processo produtivo, é possível notar claramente que a cana e os gastos da lavoura canavieira são ativáveis (ativo permanente, hoje imobilizado), e a perda do valor se dá pelo uso ou emprego da fonte produtora em virtude dos cortes que são feitos. Portanto, o ativo não se extingue, permanecendo viva a planta, perdendo somente sua produtividade (valor) pelo uso, o que diferencia da exaustão, que leva à extinção do próprio ativo. Ademais, a exaustão está vinculada à exploração de direitos cujo objeto seja mineral ou florestal, o que não se aplica à cana. Daí ser possível reconhecer que, na lavoura canavieira, há depreciação[5], aplicando-se o artigo 6° da Medida Provisória 2.159-70/2001[6].



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